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Professor de Língua Portuguesa na Rede Estadual de Ensino - Governo do Paraná

terça-feira, 7 de outubro de 2025

Indisciplina nas salas de aula

 





Um professor qualquer:

            - Eu não consigo lecionar, alunos indisciplinados, irresponsáveis e desmotivados. Como consigo mudar a realidade dentro da sala de aula?

Professor, o que você descreve é o esgotamento silencioso que muitos professores enfrentam — e que raramente é tratado com a seriedade devida. É quase uma guerra de nervos: você tenta ensinar enquanto o ambiente parece conspirar contra o aprendizado. Mas há formas reais, ainda que graduais, de virar esse jogo dentro da sala.

Antes de tudo, é importante compreender o que está acontecendo: a indisciplina e a desmotivação que você vê não são apenas “falta de educação” — são sintomas de uma desconexão profunda entre o mundo escolar e o mundo emocional, digital e social desses jovens. A escola fala uma língua que muitos alunos não reconhecem mais como a deles. Então, o desafio é duplo: recuperar a autoridade sem autoritarismo e reencantar o sentido do aprender.

Alguns caminhos que têm mostrado bons resultados — e que respeitam sua posição de professor experiente — incluem:

1.    Reestabelecer o vínculo antes da autoridade.
A indisciplina costuma ceder quando o aluno sente que o professor se importa de verdade — não com o comportamento, mas com a pessoa. Uma conversa individual curta, um gesto de respeito autêntico, uma escuta sincera muda o eixo da relação. Eles se desarmam quando percebem que não são “problemas”, mas parte da turma.

2.    Transformar o conteúdo em narrativa.
Português é um terreno fértil: cada regra gramatical tem uma história, cada texto tem um conflito humano. Quando o conteúdo ganha rosto, emoção e contexto, o aluno volta a prestar atenção. Dê-lhes motivos para se identificar com o texto — mesmo que seja através de uma música, um meme ou uma fala de série.

3.    Rituais e contratos claros.
A indisciplina prospera no terreno da ambiguidade. Combine com a turma regras simples, visíveis e possíveis — e cumpra-as com serenidade. O segredo é consistência, não rigidez.

4.    Responsabilidade compartilhada.
Dê aos alunos pequenas tarefas de gestão: líder de grupo, cronometrista, relator da aula. Quando o estudante se vê como parte da engrenagem, a resistência cai.

5.    Pequenas vitórias visíveis.
Mudar o clima da sala é um processo, não um golpe de sorte. Registre as pequenas melhoras, comente, elogie o progresso. A turma precisa ver que há avanço.

E um ponto crucial: não se culpe por uma crise que é sistêmica. A escola brasileira foi abandonada por políticas, famílias e pela cultura da pressa. Ainda assim, dentro da sala, há frestas de transformação — e é nelas que o professor renasce.



Montamos um plano prático de reaproximação da turma


com atividades e estratégias passo a passo, baseadas em tua realidade (ensino médio? fundamental? público do interior ou urbano?). Isso ajudaria a tornar o discurso em ação.

Vamos juntos transformar essa sala em território fértil de aprendizado — e de reencontro com o sentido de ensinar.

SEMANA 1 – Recomeço e contrato coletivo

Objetivo: Retomar o controle e redefinir o ambiente de sala.

1. Aula inaugural simbólica:
Abra com sinceridade:

“Nosso grupo está passando por dificuldades. A partir de hoje, vamos tentar reconstruir o jeito de funcionar aqui dentro. Quero que todos possam aprender — inclusive eu.”

2. Construção do “Acordo de Convivência”:
Peça que cada aluno sugira
uma regra que facilitaria a convivência. Escreva no quadro, vote com eles e escolha cinco. Exemplo:

·        Falar com respeito.

·        Não usar o celular durante a explicação.

·        Ouvir o colega sem interromper.

·        Cuidar do espaço físico.

·        Cumprir horários e combinados.

Passe para o cartaz, assinem e deixem fixo na parede.

3. Nova rotina diária:
Comece a aula sempre da mesma forma:
– Cumprimento breve;

– Organização das carteiras e e direcionamento dos alunos ocupando os lugares da frente da sala, transformar sala de aula em sala de aula; 

– Objetivo da aula em uma frase no quadro;

– Tempo estimado;

– Encerramento com resumo e elogio;

Essa previsibilidade gera segurança e reduz a ansiedade da turma.


SEMANA 2 – Autoridade serena e vínculo individual

Objetivo: consolidar respeito e criar proximidade.

1. Postura e coerência:
Não eleve o tom. Diga calmamente:

“Essa atitude quebra o nosso combinado. A gente conversa depois.”
E cumpra — sempre no depois, longe da plateia.

2. Conversas individuais curtas:
Reserve 3 a 5 minutos com os mais desafiadores. Pergunte algo real:

“O que tem te atrapalhado a focar na aula?”
A escuta desconcerta o aluno, porque foge do padrão de bronca.

3. Mini desafios positivos:
Exemplo: pedir que alguém leia um texto em voz alta, conduza a correção ou apresente um resumo oral. Dê destaque a quem colabora — eles aprendem que respeito rende reconhecimento.


SEMANA 3 – Engajamento e pertencimento

Objetivo: transformar o aluno em participante ativo.

1. Funções de sala:
Escolha papéis rotativos:

·        Repórter da aula: faz um resumo oral no fim.

·        Guarda da palavra: garante que um fala por vez.

·        Cronometrista: marca o tempo das atividades.

Esses papéis disciplinam sem repressão — o grupo vira parceiro do professor.

2. Conteúdos conectados ao cotidiano:
Use textos contemporâneos: memes, trechos de série, notícias, letras de música. Discuta linguagem, ironia, discurso, fake news — são portas de entrada para a reflexão e a gramática aplicada.

3. Louve as pequenas vitórias:
Diga, no fim da aula:

“Hoje conseguimos trabalhar com menos interrupções. Isso mostra que dá certo quando cada um se compromete.”
O reconhecimento público solidifica a mudança.


SEMANA 4 – Consolidação e cultura de respeito

Objetivo: tornar a nova disciplina um hábito coletivo.

1. Revisão do contrato:
Releiam o cartaz inicial. Pergunte:

“O que estamos conseguindo manter? O que ainda precisa melhorar?”
Atualizem as regras com base na vivência.

2. Feedback contínuo:
Elogie quem manteve o foco, mas também cobre coerência:

“Gosto de ver quando vocês se respeitam, mas a gente ainda precisa controlar o celular.”

3. Mini assembleia quinzenal:
Cinco minutos no fim da aula de sexta: cada grupo diz um ponto positivo da semana e um ponto a melhorar. Essa prática cria consciência coletiva.


A MANUTENÇÃO (a partir do segundo mês):

1.    Mantenha o ritual de começo e fim de aula.

2.    Continue usando textos conectados à vida real.

3.    Atualize as funções de sala a cada 15 dias.

4.    Reforce elogios e consequências coerentes.


Importante: autoridade se consolida com calma e constância, não com gritos. Em ambiente urbano, o professor que se mantém firme e sereno se destaca — a turma começa a se regular por espelho.

 

PLANO DE AÇÃO: RECONSTRUINDO A DISCIPLINA E O SENTIDO DE APRENDER

FASE 1 – Reconstrução da autoridade e do vínculo (duas primeiras semanas)

Objetivo: estabelecer respeito sem autoritarismo e reconectar-se com a turma.

1. Recomeço simbólico:
Na primeira aula da semana, inicie com um breve diálogo aberto:

“A gente vai tentar algo diferente. Quero que este espaço volte a ser de aprendizado, mas também de convivência boa. Vamos reconstruir o jeito de funcionar aqui.”

Proponha um contrato coletivo de convivência: cada aluno sugere uma regra de respeito; depois, o grupo vota nas mais importantes (máximo 5). Escreva em cartaz, assinado por todos, e exponha. A regra escolhida pelo grupo é mais respeitada que a imposta.

2. Regras claras e consequências serenas:
Não discuta durante o conflito. Mantenha serenidade e aplique o combinado:

“Fulano, a gente tem uma regra assinada. Amanhã conversamos.”
Essa distância no tempo corta o embate imediato e preserva tua autoridade.

3. Aproximação pessoal:
Separe um minuto no início ou fim da aula para conversar com alunos-problema — não sobre punição, mas sobre o que está acontecendo. Surpreende-los com empatia desarma resistências.


FASE 2 – Engajamento e pertencimento (semana 3 a 6)

Objetivo: dar ao aluno um motivo para se importar com a aula.

1. Reencantar o conteúdo:
Use textos curtos, vídeos ou letras de música que dialoguem com o cotidiano deles. Exemplo: discutir linguagem e ironia usando memes, ou narrativas contemporâneas para analisar vozes sociais. O conteúdo é o mesmo — o ponto de partida é que muda.

2. Responsabilidade compartilhada:
Crie papéis:
Guarda da palavra (quem garante que um fala por vez)
Cronometrista (controla tempo das falas)
Repórter da aula (resumo rápido do que foi aprendido)
Essas pequenas funções tornam o grupo corresponsável pela ordem.

3. Valorização das pequenas vitórias:
Reconheça publicamente quando uma turma melhora o comportamento, mesmo que ligeiramente. Isso reforça o comportamento positivo e muda a cultura interna.


FASE 3 – Consolidação (após 2 meses)

Objetivo: manter o equilíbrio e a motivação.

1. Rotina previsível:
A disciplina floresce na previsibilidade. Comece toda aula com o mesmo ritual: saudação, objetivo da aula, tempo de execução, fechamento. O aluno entende o ritmo e se adapta.

2. Espaços de escuta:
Reserve um momento quinzenal (cinco minutos) para um “bate-papo de turma”: o que está funcionando, o que pode melhorar. Essa escuta devolve pertencimento e evita que os conflitos se acumulem.

3. Feedback positivo e coerente:
Mostre que o comportamento tem consequência — tanto boa quanto ruim. A coerência é a raiz da autoridade legítima.


Complementos específicos por faixa:

Fundamental II: precisa de rotina e de sentir-se notado. Trabalhe mais com jogos linguísticos, dramatizações e desafios rápidos.

Ensino Médio: precisa de sentido e utilidade. Mostre como o conteúdo se liga à vida real — por exemplo, ao analisar fake news, discursos políticos, letras de música.


A mudança não será imediata, mas é inevitável se for constante. Uma turma indisciplinada é, quase sempre, uma turma desmotivada — e motivação se constrói com clareza, escuta e direção firme.

Após ações espero um feedback. 

Obrigado e bom trabalho