“Na escola se aprende, não se ensina”
Bernardo Toro, educador, escritor e filósofo colombiano
Quando o assunto é educação, poucas pessoas são ouvidas com tanta atenção quanto o escritor e filósofo colombiano Bernardo Toro, 68 anos, um dos mais influentes pensadores da América Latina na atualidade. Com visões abrangentes sobre o tema, que levam em conta o papel das comunicações e das organizações não governamentais e a ideia da educação como um projeto político e um direito, Toro rechaça esquemas tradicionais de ensino, como aulas muito focadas em provas e no professor. Palestrante do Salamundo 2013, encontro internacional de educação ocorrido neste mês em Curitiba, ele apresentou ideias simples para melhorar a educação no Brasil: foco na escrita e na leitura e a importância de uma educação igualitária para todos. Ele falou à Gazeta do Povo após a sua participação no evento. Confira os principais trechos da entrevista:
Por que o senhor diz que devemos parar de priorizar o ensino e focar na aprendizagem?
Se o ensino é mais importante do que a aprendizagem e algo vai mal, os culpados são os alunos. Se a aprendizagem é mais importante, são os adultos – nós – os que têm a responsabilidade de mudar as coisas. A escola é lugar de aprender e não de ensinar. O professor é responsável pela aprendizagem, não pela classe. Um educador não é o profissional que dá aulas. A aula não define a profissão. Todos aqui podem dar aulas, é fácil. O que não podemos é fazer com que alguém aprenda. Isso é diferente. Se não mudarmos esses mecanismos, o aluno continuará sendo o culpado do fracasso e nada mudará.
Como fazer isso na prática?
No momento em que se foca na aprendizagem do aluno e passa a não acusar as crianças pelo fracasso, mas a escola, os administradores públicos... isso vai melhorar. Temos de criar condições para que a aprendizagem ocorra, para que o professor se responsabilize por isso. Se quisermos que o educador foque na aprendizagem, temos de dar condição. E a condição para que a escola melhore não deve partir do educador, mas da sociedade civil.
Quais os desafios do Brasil? Por onde começar?
Eu sempre insisto: o Brasil, a Colômbia, a América Latina não vão mudar a educação enquanto não focarem em um problema fundamental, o nosso maior problema: a escrita e a leitura. 50% das crianças latino-americanas não leem e não escrevem bem. Na América Latina, apenas 12% das crianças, de escolas públicas ou privadas, alcançam bons níveis. Se não enfrentarmos o problema da leitura e da escrita, estaremos construindo sobre pisos falsos. Ler e escrever são atividades cotidianas que não aparecem, não são vistosas, e é aí que está o perigo.
Em relação ao professor, se fala em aumentar a competitividade entre eles e propor bônus para os melhores. Os críticos dizem que isso é responsabilizar o professor pelos erros do governo. O que o senhor pensa sobre isso?
Um bom professor é aquele que consegue fazer com que todos os seus alunos aprendam o que precisam aprender no momento em que devem aprender, e que aprendam com felicidade e solidariedade. Dar aula não é a profissão do educador. O professor é o profissional do aprendizado e sua competência é definida pela quantidade de aprendizados úteis que consegue fornecer às crianças.
No Brasil, muitos jovens desistem da escola por viverem em condições de pobreza e terem de trabalhar muito cedo. Esse fator é levado em conta pelas autoridades como deveria?
O critério geral é o seguinte: quanto mais pobre é uma população, maior deve ser a qualidade de suas escolas e colégios porque os pobres não podem substituir o que a escola não oferece. Com esse critério, há mais de 12 anos se iniciou em Bogotá a política de “colégios de concessão”. Selecionava-se um colégio privado de qualidade reconhecida pela sociedade e pedia-se que se construísse outro da mesma categoria em um bairro muito pobre, com recursos da cidade. Só podiam entrar as crianças do bairro onde se localizava o colégio. Os pobres, assim como os ricos, sabem distinguir a educação de qualidade e querem-na para seus filhos.
Há um projeto do senador Cristovam Buarque para que todos os alunos estudem em escolas iguais. Essa é uma boa estratégia?
Creio que esta é a melhor estratégia e a única que faria possível ter um sistema de educação de alta qualidade, pois articularia as elites educacionais do Estado com as do setor privado. Quando falo em elite educacional, não falo apenas das pessoas que têm dinheiro, mas sim das pessoas que têm poder de decidir e de influenciar. Não é uma questão de dinheiro, de mais professores, de mais material. É preciso vontade política.
Uma pergunta mais pessoal: o que levou o senhor a se interessar pelo tema da educação? Qual é o maior desafio que já enfrentou?
Entendo que uma boa educação pode mudar a vida de qualquer pessoa, em especial a dos mais pobres. Meu maior desafio é conseguir fazer da educação um bem público, é dizer que podemos ter uma educação de igual qualidade para todos. Devemos eliminar a existência de dois sistemas educacionais de qualidades diferentes – o estatal e o privado – para termos um sistema educacional de igual qualidade para todos.