Além da redução da maioridade penal, ganha força discussão para aumentar o tempo de privação de liberdade de adolescentes infratores.
Em todo Paraná, 936 adolescentes cumprem alguma medida de restrição de liberdade em algum dos 18 Centros de Socioeducação (Cense) do estado. Um quinto deles tem idades entre 18 e 21 anos, mas a maioria (477) tem 17 anos. Em tempos de discussão sobre a redução da maioridade penal, um novo debate vem ganhando força: a mudança no regime de cumprimento da pena desses jovens. O governador de São Paulo, Geraldo Alckmin (PSDB), chegou a sugerir um tratamento diferenciado para aqueles que ainda estiverem presos depois dos 18 anos.
Atualmente, os adolescentes no Brasil podem receber medidas restritivas de liberdade a partir dos 12 anos e ficam no sistema até completar 20 anos e 11 meses. A proposta do governador é de mudar a lei, aumentando o tempo de privação de liberdade e separando os jovens com 18 anos dos demais. A intenção não é de enviá-los para o sistema penitenciário comum, que já sofre com a superlotação. No Paraná, a população carcerária é de 28.228 detentos em penitenciárias e cadeias, mas o déficit de vagas é de 5.321.
Igreja é contra
A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) voltou a se manifestar contra a redução da maioridade penal, a exemplo do que havia feito em abril de 2009. “A redução da maioridade penal violenta e penaliza ainda mais os adolescentes, sobretudo os mais pobres, negros, moradores de periferias”, disse o presidente da CNBB, dom Raymundo Damasceno Assis, cardeal-arcebispo de Aparecida (SP), na sexta-feira durante a Assembleia Geral da CNBB, em Aparecida.
Socioeducação
Três entre 10 punições são em regime fechado, a pena mais severa
A implantação no ano passado do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), um equivalente à Lei de Execução Penal, vêm apresentando bons resultados, mas ainda há muito o que melhorar. O coordenador geral do Sinase, Cláudio Vieira, afirma que as medidas de privação de liberdade geralmente são as punições mais aplicadas aos adolescentes. As penas de meio aberto ainda não são melhor utilizadas porque necessitam do trabalho conjunto de estados e municípios, que ainda estão se adaptando à nova legislação.
Mudanças
De acordo com dados da Secretaria de Direitos Humanos, 58.764 adolescentes cumpriam medidas socioeducativas no ano passado. Desses, 18.107 (30%) estavam em regime fechado e 40.657 (60%) no meio aberto.
Para atender bem esses jovens, é preciso mudar a estrutura física e arquitetônica de muitas unidades de socioeducação, além de implementar com efetividade as medidas de atendimento individualizado e ressocialização.
“Aquelas unidades que já estão adaptadas ao Sinase vêm recebendo mudanças positivas. Isso envolve mudanças espacial e arquitetônica, pedagógica, da atuação do sistema de Justiça e de integração das famílias dos jovens”, analisa.
Para a psicóloga e ex-secretária da Criança do Paraná Thelma Alves de Oliveira, o padrão de punição para um jovem deve ser levado em consideração. “Se você entende que tem que punir, mas dentro de um outro padrão de convívio, aí muda tudo”, diz a psicóloga, que defende as políticas dos Censes. Esses centros precisam de um plano individualizado de atendimento para cada adolescente, que também tem direito e acesso à educação formal e reintegração familiar. “A internação é um período de resgate de direitos, é um tempo em que o adolescente pode se questionar e tentar reorientar seu caminho”, avalia.
Thelma contemporiza o conceito de tempo, percebido de forma diferente pelos jovens. “Três anos de internamento em 15 anos de idade é um quarto da vida do adolescente, é outra percepção de tempo”, analisa. Ela ainda pondera que no sistema penitenciário comum os adultos possuem uma série de medidas de redução de pena e, muitas vezes, acabam ficando presos até por um período menor do que o adolescente. “Esse tempo médio que o adulto fica preso é mais ilusão”, afirma.
Menos criminalidade
A redução da maioridade penal ou o aumento da pena dos adolescentes são medidas que não devem diminuir os índices de violência e criminalidade no país, na opinião do coordenador geral do Sistema Nacional de Atendimento Socioeducativo (Sinase), da Secretaria de Direitos Humanos da Presidência da República, Cláudio Vieira. Para ele, os adolescentes também são vítimas dessa mesma violência e o Brasil vive uma epidemia de morte de jovens na faixa dos 15 aos 29 anos.
“Temos uma absoluta incapacidade de enfrentar crimes associados a facções criminosas organizadas e envolvem tráfico de drogas, pessoas e armas. Esse conjunto possibilita que armas cheguem a adolescentes”, analisa. Para ele, a possibilidade de colocar meninos e meninas cumprindo pena com adultos é o mesmo que entregar de bandeja esses jovens para o crime organizado.
Artigo
Eles não têm mais medo do “bicho-papão”
Cid Vasques, secretário de Estado de Segurança Pública do Paraná
Eles não têm mais medo do “bicho-papão”
Cid Vasques, secretário de Estado de Segurança Pública do Paraná
Essa não é uma discussão casuística, advinda somente em virtude dos últimos graves acontecimentos de repercussão, mas de uma necessária releitura histórica do instituto da maioridade penal. O adolescente entre 16 e 18 anos da época da entrada em vigor da Constituição (1988) ou do ECA (1990) não tem mais o mesmo perfil. Hoje, ele tem muito mais acesso à informação do que antes. A rapidez do desenvolvimento deles, considerados “pessoas em processo de formação” não se compara à existente mais de 20 anos atrás.
Como afirma uma das maiores autoridades no assunto, o Dr. Drauzio Varella: “Cadeia brasileira não é feita para recuperar ninguém. É para tirar de circulação”. E lamentavelmente é assim. Mas, como secretário de Segurança do meu estado, nos dias de hoje minha preocupação é muito maior com outro modelo de sistema prisional, o sistema prisional imposto pelo medo ao cidadão de bem. O sistema prisional das cercas elétricas e das concertinas que transformam as casas das pessoas em verdadeiras prisões. Estão elas enclausuradas pelo pavor causado em decorrência da violência sem medida.
Há sinalizações de propostas para modificar a legislação sobre o tema, que ora pretendem transferir o menor infrator para penitenciárias, depois de completar os 18 anos, numa espécie de sistema híbrido, ora atribuir ao Ministério Público a função institucional de promover um incidente de desconsideração de inimputabilidade penal de menores de 18 e maiores de 16 anos.
Mas meu posicionamento é o de reduzir a maioridade penal para 16 anos, em relação a todos os delitos. Quem pode votar para Presidente da República também deve ser responsabilizado por infrações penais que cometer. Esse não é um discurso radical, como muitos afirmam, mas sim um discurso coerente.
Se ficar como está, continuarão as mães enterrando seus filhos com amargas lágrimas, enquanto o riso se mantém estampado na cara de quem deveria ser tratado como bandido, mas é carregado no colo como “pessoa em processo de formação”, sustentado por teorias totalmente descompassadas da realidade. A única formação que vejo é a voltada para a mais violenta espécie de criminalidade, que deve ser combatida com o necessário rigor, e não com a brandura hoje existente, antes que se coloque a sete palmos não só os filhos, mas também a esperança do cidadão de bem de viver numa sociedade sem medo.
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