Azulay na época do seu programa de tevê: “Gepeto brasileiro”
MAIS COM MENOSA imaginação é uma fonte inesgotável de recursos
Daniel Azulay, artista plástico e educador.
Daniel Azulay e seus personagens – como Xicória e o Professor Pirajá – marcaram uma geração que aprendeu a desenhar na frente da tevê e aguardava a transformação de sucatas em brinquedos divertidos. A criançada das décadas de 1970 e 1980 se encantava com a nova utilidade dada a caixas vazias, palitos, isopor e outros materiais. Hoje, aquilo que era feito há 40 anos se enquadra em discussões sobre sustentabilidade e métodos de fazer mais com menos.
Aos 65 anos, Azulay é voluntário do projeto “Crescer com Arte”, criado por ele e destinado a crianças e jovens carentes. Além disso, viaja o mundo realizando exposições, palestras e workshops de arte-educação e responsabilidade social. No fim de maio, ele participou da feira Educar/Educador, em São Paulo, onde apresentou a palestra “Fazendo mais com menos. Como inovar em atividades educativas com recursos limitados?”. A Gazeta do Povo conversou com Azulay durante o evento. Confira os principais trechos da entrevista:
Como o senhor se define como pessoa e profissional?
Por natureza, sou autodidata, experimentador e fazedor de artes. Como pessoa e profissional, sou o Gepeto oficial da tevê brasileira. Vivo brincando em serviço. Por essa razão, a vida também gosta de brincar comigo. Quando as coisas se repetem, vem a rotina e é muito mais cômodo deixar tudo como está. É hora de mudar e começar a se reinventar.
Qual a importância de uma infância bem vivida?
A infância é uma das fases mais importantes da vida. Sinto-me tão recompensado quando algumas pessoas, hoje com seus 40 anos, chegam para mim e dizem que eu fiz parte da infância delas. Ter feito parte de uma lembrança divertida e alegre me emociona muito. Hoje, infelizmente, as crianças não estão vivendo intensamente a sua infância.
As crianças estão deixando de ser crianças antes do tempo?
As crianças estão virando adultos em miniatura. É comum lamentarmos que a vida moderna, os hábitos e as transformações do mundo vêm piorando, no sentido que a infância vem se perdendo. A menina quer chegar rápido à adolescência e virar mulher. Os modelos e os ídolos são outros. São comportamentos que não condizem com o universo infantil.
O que os pais podem fazer para transmitir outros valores para seus filhos?
É o que eu tento informar desde os tempos da tevê. A família educa, modela o caráter, transmite valores e prepara os filhos para a vida ensinando o que é ético, a discernir o que é correto e errado, enfim, educando com responsabilidade. Os pais precisam estar presentes e cooperando de forma afetiva para que seus filhos tenham prazer em aprender. Os pais têm que estimular as crianças a adquirirem conhecimento; eles têm que levar os filhos ao teatro ao cinema. Não podem deixar a criança passiva na frente da internet e da televisão adquirindo um conhecimento supérfluo que não vai levar a nada.
O contato com a arte pode ajudar?
A gente precisa sempre estar se renovando. A arte pode contribuir para qualquer pessoa se transformar em pessoas mais bem informada, mais sensível ao aprendizado. Para fazer arte é preciso estudo e conhecimento. A inspiração não vem do nada. A arte ajuda muito a pessoa a se identificar e se autoconhecer.
Atualmente, as crianças recebem estímulos suficientes para exercitar a criatividade?
Eu diria que as crianças recebem estímulos em grande quantidade de informação. Filtrar toda essa carga de informação, canalizando para o que é positivo, construtivo e saudável é uma responsabilidade para os pais e professores. A criança sozinha não tem como discernir e assimilar adequadamente tanta informação em quantidade e nem com qualidade.
Como inovar em atividades educativas com recursos limitados?
Usando a imaginação, que é uma fonte inesgotável de recursos. Materiais simples como a sucata doméstica, brinquedos com materiais recicláveis, máscaras e fantasias de papel e papelão. Jogos recreativos, como bilboquê, botão, tabuleiro, amarelinha. Brincadeiras tradicionais, como cirandas, pular corda, pique-esconde, soltar pipa. A lista é grande e divertida!
Como o senhor avalia o currículo das escolas no que diz respeito ao desenvolvimento da criatividade e da inovação?
É um desafio muito desigual. O professor tem uma posição ingrata de transmitir conhecimento e ele compete com outras formas espontâneas de assimilação de informação. Muitas vezes, o professor está ensinando informações que a criança já sabe por outros meios, como a internet. A criança hoje copia trabalhos prontos da internet. A escola proíbe o celular e os joguinhos em sala de aula e tenta passar a disciplina, buscando uma concentração que nem sempre a criança tem. O desafio da escola deve ser constante de sempre buscar uma plataforma satisfatória em que o aluno respeite o professor e tenha a consciência de que a escola trabalha para oferecer um ambiente seguro e de estímulo para o aprendizado.
A tecnologia é inimiga da criatividade infantil?
Não, de forma alguma! A tecnologia estimula o aprendizado. A tecnologia é uma aliada. Grande ferramenta para a educação e alimenta a criança com conhecimento interativo e estimula o raciocínio. Por isso a criança de hoje é superior à de antigamente.
O que temos hoje na tevê que pode ser comparado com o que o senhor fazia há 40 anos?
O Art Attack e o Mister Maker são as propostas e formatos de programa mais próximos do que fiz nos anos 70, 80, 90... até 2005.
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