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terça-feira, 12 de março de 2013

Falta capacitação para ensinar a cultura afro



Ilustração/ Felipe Lima
Ilustração/ Felipe Lima /
OBRIGATORIEDADE

Falta capacitação para ensinar a cultura afro

Apesar da boa vontade dos professores, qualidade de iniciativas fica comprometida pela carência de profissionais que dominem o tema.
Há dez anos, a Lei número 10.639 incluiu a obrigatoriedade de conteúdos referentes à cultura e história afro-brasileira no currículo da educação básica. Desde então, universidades e movimentos sociais têm se esforçado para suprir a falta de capacitação de professores na área e vencer a resistência de alguns educadores que ainda encaram com estranheza a proposta.
A legislação que alterou a Lei de Diretrizes e Bases não cria uma nova disciplina, mas explicita a necessidade de se trabalhar a temática, especialmente nas áreas de Educação Artística, Literatura e História. As escolas têm autonomia para incluir o assunto em outras disciplinas, mas, o obstáculo maior, segundo analistas, ainda é a escassez de subsídio para oferecer aos estudantes algo além do tradicional ensino sobre a escravidão no Brasil.
Didática
É preciso criatividade para ir além do tema da escravidão
Um dos maiores benefícios trazidos pela inclusão da temática afro-brasileira nos currículos seria uma apresentação mais positiva da contribuição dos negros para o desenvolvimento do país, acabando com o foco exclusivo na questão dos escravos durante o período colonial, diz a doutoranda em Educação pela UFPR Adriane de Quadros Sobanski, que também dá suporte a professores pela Secretaria de Estado da Educação (Seed). “Os negros somem dos livros de História depois da abolição”, lamenta.
Ela cita o uso de poemas, crônicas, culinária e música da África como uma possibilidade de mostrar a influência cultural africana no Brasil. No colégio Bom Jesus, por exemplo, a temática foi introduzida na disciplina de Educação Física, na qual os alunos passaram a estudar a capoeira como conteúdo regular, conta o coordenador do ensino fundamental 2, Pedro Gardim. Aulas de História específicas sobre as populações africanas ocorrem no 7º ano.
O professor Paulo Vinicius Baptista da Silva, da UFPR, diz que a Biologia é outra disciplina que tem contribuído muito no sentido de combate ao preconceito, já que por meio dela os estudantes entendem que, biologicamente, não há diferenciação de raças na espécie humana.
Capacitação
Em Curitiba, a Secretaria Municipal de Educação oferece frequentemente cursos de capacitação na área desde 2006, segundo informa Elaine Beatriz de Oliveira Smyl, dirigente da recém-criada pasta de Coordenação de Educação para as Relações Étnico-Raciais, de Gênero e de Diversidade Sexual. Além dos cursos, a partir de 2008, a prefeitura passou a exigir de todas as escolas municipais a formação de comissões de educação para relações étnico-raciais, compostas por estudantes, professores e funcionários. Esses grupos devem facilitar a implantação de iniciativas multidisciplinares sobre o tema. (JDL)
Conte a sua experiência
Como a escola de seu filho aborda a cultura e a história afro-brasileira durante as aulas?
Segundo o professor de História Fabio Luciano Iachtechen, da Universidade Federal do Paraná (UFPR) e das Faculdades Integradas do Brasil (UniBrasil), aparentemente, há muita boa vontade na aplicação da lei, mas, como a mudança veio antes de qualquer preparo dos docentes, muitas iniciativas carecem da consistência adequada. “A lei veio antes de qualquer formação ou mesmo da disponibilidade de materiais didáticos, então, as tentativas vêm sendo feitas de uma forma um pouco atropelada”, diz.
Para Iachtechen, nota-se uma clara preocupação em responder à demanda por parte dos agentes envolvidos, mas especialmente no que diz respeito à história da África, há escassez de professores que dominem o tema com segurança. Mesmo a UFPR só abriu concurso em 2012 para a contratação de professores universitários com formação específica no tema. “Quem vai trabalhar esse conteúdo acaba tendo de ser autodidata”, lamenta o professor.
Resistência
Já o professor Paulo Vinicius Baptista da Silva, do Núcleo de Estudos Afro-Brasileiros da UFPR, considera que as resistências existentes à obrigatoriedade se devem mais a um apego ao modo como a história e a própria cultura nacional eram ensinadas décadas atrás, quando não era dado tanto destaque à herança étnica dos afrodescendentes. “Uma mudança na política curricular como essa não se muda com facilidade porque mexe numa tradição bastante arraigada.”
Ainda assim, Silva cita alguns avanços notáveis. Em 2010, ele trabalhou na articulação de projetos relacionados ao tema no Sul do Brasil. Na época, as escolas do Paraná teriam se destacado com uma quantidade de iniciativas sobre o tema superior às de Santa Catarina e Rio Grande do Sul. Ele cita como exemplo o trabalho desenvolvido por professores no município de Pitanga, onde a população negra é menor do que a média do estado. “Ficamos surpresos ao visitar três escolas em que as gestoras dos projetos na área eram de origem ucraniana”, conta.

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