Erguida em 1928, residência foi remontada em 1998 no parque para virar museu. Falta dinheiro à Fundação Cultural para recuperá-la
PATRIMÔNIO CULTURALA memória de Stenzel precisa de casa nova
Levada ao Parque São Lourenço para virar museu, residência do artista está fechada há 3 anos.
Decepção
“Mulher sentada” foi parar na “Praça do Homem Nu” a contragosto do artista
Ao contrário do que se costuma dizer, Erbo Stenzel não fez o homem nu da Praça 19 de Dezembro, em Curitiba. Pelo contrário, odiou o projeto da praça que, depois, recebeu a estátua da “mulher sentada”, que deveria ter ido para outro lugar. A artista plástica Didonet Thomaz, pesquisadora da vida de Stenzel, conta que ele recebeu o convite para fazer a praça, mas, como não tinha canteiro de obras, recusou a proposta. Em 1972, em uma entrevista à então estudante de arquitetura Maria Isabel Vardanega Schasko e à jornalista Eliane Artigas (a gravação está no Museu da Imagem e do Som), Stenzel conta que fez apenas o primeiro gesso do que poderia ser a estátua do homem nu, mas não esculpiu a pedra. Sua contribuição teria sido no painel em baixo relevo que está na praça.
Modelo
Stenzel foi quem criou a “mulher sentada”, que acabou na praça para a tristeza do artista. Didonet conta que a escultura da mulher pode ter sido inspirada na figura de Anita Cardoso Neves, modelo da escola de Belas Artes do Rio, com quem ele pode ter tido um romance, resultando na vinda de Stenzel a Curitiba. “Encontrei cartas inéditas dela para ele que estão com a família Stenzel. São cartas picantes, nas quais se queixa de ele não escrever mais a ela”, conta Didonet.
A estátua deveria ter sido colocada no prédio do Tribunal do Júri, pois a mulher com a lata significaria a própria Justiça. Quando ela chegou a Curitiba, porém, o motorista parou o caminhão na Riachuelo para dormir e ao ver a estátua o povo começou a espalhar pela cidade que a mulher do homem nu havia chegado.
No dia seguinte, a escultura foi levada ao Tribunal, mas as obras não estavam prontas. Depois foi transportada para trás do Palácio do Governo. Por aclamação popular, acabou na Praça 19 de Dezembro. “Stenzel diz que odiou ver a escultura lá, porque ela não havia sido feita para aquele lugar. Até porque, o homem nu tem oito metros de altura e, ela, em pé, teria uns cinco. Ou seja, um não foi feito para ser o par do outro”, diz Didonet.
Amor não correspondido
Com a morte de Stenzel, uma parente distante, Gerda Methzenthin, passou a morar na casa. Costureira, ficou como uma espécie de tutora do imóvel. Ao conhecer a casa em 1986, a artista plástica Didonet Thomaz descobriu a paixão recolhida de Gerda por Stenzel. “Como não se achava bonita, acreditava não ser merecedora do amor dele”, conta Didonet. Gerda foi sepultada no lugar onde estavam os ossos de Stenzel.
Hoje são tomadas algumas medidas para a manutenção do espaço, como a limpeza interna, a poda das árvores no entorno e a limpeza das calhas. Mas o que a pequena casa cor-de-rosa precisa mesmo é de uma restauração, ainda sem data para começar por falta de orçamento.
Stenzel morou no imóvel até ficar bem velhinho e, sem autonomia, acabar no Lar Dona Ruth. Morreu em 1980. A casa que hoje está sucumbindo já resistiu bravamente a um empreendimento que quase não deu certo. Ela deveria abrigar uma loja de decoração do cunhado de Stenzel. Mas, logo ao ser erguida, em 1928, ela fraquejou (as paredes cederam e foram amarradas), o que fez com que o empreiteiro desistisse da ideia de montar justamente uma loja de decorações e pinturas num local que havia sido mal projetado.
Exposição
Stenzel não se importou com tudo isso e morou na residência, que resistiu bravamente inclusive à desmontagem e à remontagem no Parque São Lourenço. Transferida para o atual endereço, ela expunha obras do artista, como peças originais, réplicas de esculturas e documentos que contavam a trajetória dele. Em 2009, foi fechada e todos os itens do acervo foram devolvidos à Secretaria de Estado da Cultura: as cerca de 100 peças pertencem à família dele, mas estão em comodato com o governo.
O Paraná tem ainda outras 900 peças de Stenzel doadas ao acervo do Museu de Arte do Paraná, repassadas ao Museu Oscar Niemeyer (MON). Atualmente as peças compõem uma exposição permanente no MON (alguns dos objetos pertenceram ao ateliê de Stenzel).
“Digo que ele foi o mais tecnológico dos artistas, pois não fundou um estilo próprio, mas se preocupou em bem aplicar a técnica da gravura e da expressão. Deve ter sido um dos únicos professores da Embap [Escola de Música e Belas Artes do Paraná] a trabalhar com figuras humanas”, diz a artista plástica e pesquisadora Didonet Thomaz, estudiosa de Stenzel.
A Fundação Cultural de Curitiba afirma que “não tem medido esforços para encontrar alternativas e fontes de financiamento para iniciar o restauro, a fim de que o local volte a funcionar e a receber o público outra vez.”
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