Claudia, do Procon-PR: superendividamento é uma das maiores preocupações
Proposta preparada por comissão de juristas tem o objetivo de modernizar o CDC, que está em vigor há 21 anos.
Na véspera do Dia Internacional do Consumidor, a comissão de juristas encarregada de elaborar uma proposta de atualização do Código de Defesa do Consumidor (CDC) encaminhou ontem ao Senado Federal um anteprojeto com sugestões de modernização nessa legislação.
A proposta busca regular e inserir mecanismos de proteção ao consumidor brasileiro em casos de compras pela internet, na oferta de crédito e endividamento das famílias e nos processos de causas coletivas, situações que não são expressamente previstas no CDC, em vigor desde setembro de 1990.
“A atualização que se propõe é cirúrgica. O CDC é um marco da cidadania, mas, passados 20 anos, precisa de atualização”, defende o ministro do Supremo Tribunal de Justiça (STJ) Herman Benjamin, membro da comissão.
A proposta final da comissão foi formulada após 37 audiências públicas com senadores, procuradores da República e organismos de defesa do consumidor. O texto será agora encaminhado à Comissão de Meio Ambiente, Defesa do Consumidor e Fiscalização e Controle (CMA) do Senado. Para entrar em vigor, ainda terá de ser aprovado pelo plenário, depois pela Câmara dos Deputados e, enfim, ser sancionado.
Na questão do comércio eletrônico, o projeto propõe a obrigatoriedade da identificação de contato e endereço físico em destaque nos sites de vendas. Também prevê a suspensão e proibição de vendas por meio eletrônico de fornecedor reincidente em práticas abusivas, como atrasos na entrega dos produtos.
Outro capítulo restringe a publicidade de crédito para se evitar a indução ao superendividamento, proibindo, por exemplo, expressões como “taxa zero”. Pela proposta, os agentes financeiros serão obrigados a fornecer informações, com transparência, sob pena de redução forçada dos juros.
A coordenadora do Procon-PR, Claudia Silvano, avalia que essa era a questão mais urgente para ser tratada no anteprojeto de reforma do CDC. Segundo ela, a nova redação permitirá uma abordagem jurídica mais precisa na resolução dessas situações. “Com essa interpretação pode-se verificar, por exemplo, se o próprio banco não foi irresponsável ao facilitar o crédito”, diz.
O especialista em Direito do Consumidor Bruno Miragem, professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS), considera positivas as mudanças. “A proposta não mexe com o que está dando certo, mas legisla de forma clara sobre questões que, até então, só garantiam proteção através de análise interpretativa”, avalia. Ele alerta, no entanto, para a possibilidade de que a discussão no Congresso enfraqueça o CDC. “O processo legislativo é algo que se sabe como começa, mas nunca se sabe como termina.”
Proposta desagrada um dos “pais” do CDC
A proposta de atualização do CDC desagrada um dos pioneiros na área do Direito do Consumidor no Brasil. O advogado, consultor jurídico e professor de Direito do Consumidor José Geraldo Brito, que foi coordenador-adjunto da comissão especial que elaborou o anteprojeto de lei que se transformou no CDC, considera a reforma “desnecessária e arriscada”.
“No momento em que se coloca na mesa do Congresso qualquer projeto que seja, todo mundo vai querer meter a colher. Tramitam nas duas casas mais de 500 propostas para alterar o Código. Todos esses parlamentares têm legitimidade para propor mudanças ao texto e todos vão querer aparecer de alguma forma. O CDC estará sujeito a pressões e lobbies de grupos. Basta ver o exemplo do que está acontecendo em torno da reforma do Código Florestal”, aponta.
Para Filomeno, o fortalecimento da defesa dos direitos do consumidor no Brasil não depende da questão legislativa. “O Código é bom, é amplo, é moderno. O que deve ser feita é a aplicação cada vez mais pronta e eficaz das leis já existentes”, diz.
● Comércio eletrônico
Criação de um novo capítulo para cuidar desse tipo de relação de consumo;
Todas as informações sobre a identificação do fornecedor, inclusive endereço físico, deverão ser disponibilizadas em destaque e com fácil visualização nos sites de vendas;
O consumidor terá assegurado o direito de receber confirmação da transação e corrigir eventuais erros na contratação a distância;
O fornecedor ficará proibido de enviar mensagens eletrônicas não solicitadas (spam) aos consumidores com os quais não possua relação de consumo prévia, ou que manifestaram sua recusa diretamente ou em cadastros de bloqueio;
Reforça e facilita o direito de arrependimento em sete dias do contrato a distância;
Inclui a pena de suspensão e proibição de utilizar o comércio eletrônico a fornecedor que for reincidente em práticas abusivas contra consumidores;
Em caso de descumprimento, um juiz poderá determinar o bloqueio de contas bancárias e a suspensão do repasse de pagamentos e transferências financeiras como forma de compelir o cumprimento;
● Superendividamento do consumidor
Proíbe promover publicidade de crédito com referência a “crédito gratuito”, “sem juros”, “sem acréscimo”, com “taxa zero” ou expresssão de sentido ou entendimento semelhante;
Estabelece a concessão do crédito responsável, obrigando o fornecedor a, além de informar, aconselhar o consumidor e avaliar de forma leal as condições deste repagar suas dívidas, sob pena de redução dos juros;
Cria a figura jurídica do “assédio de consumo”, definido como pressão ao consumidor, em especial se idoso, analfabeto, doente ou em estado de vulnerabilidade agravada, para contratar o fornecimento de produto, serviço ou crédito, em especial se a distância, por meio eletrônico ou por telefone, ou se envolver prêmios;
Institui a conciliação em caso de superendividamento, de forma a estimular a repactuação das dívidas dos consumidores em audiências conciliatórias com todos os credores, onde se elabora plano de pagamento de até 5 anos para quitar suas dívidas, preservado o mínimo existencial.
● Ações coletivas
Estabelece a prioridade de julgamento; Eficácia da decisão em todo território nacional, quando o dano ao consumidor for nacional; Cria medidas processuais que irão agilizar o andamento da ação coletiva.
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