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sexta-feira, 13 de abril de 2012

STF libera interrupção de gravidez


Antecipação do parto de feto anencéfalo poderá ser feita sem que ato seja considerado.

Por decisão do Supremo Tri­bunal Federal (STF), mulheres que decidem abortar fetos anencefálicos e médicos que provocam a interrupção da gravidez não cometem crime A maioria dos ministros entendeu que um feto com anencefalia é natimorto e, portanto, a interrupção da gravidez nesses casos não é comparada ao aborto, considerado crime pelo Código Penal. A discussão iniciada há oito anos no STF foi encerrada em dois dias de julgamento.
A decisão livra as gestantes que esperam fetos com anencefalia – ausência de partes do cérebro (veja o info) – de buscarem autorização da Justiça para antecipar os partos. Algumas dessas liminares demoravam meses para serem obtidas. E, em alguns casos, a mulher não conseguia autorização e acabava, à revelia, levando a gestação até o fim. Agora, diagnosticada a anencefalia, ela poderá se dirigir diretamente a seus médicos para a realização do procedimento.

  • Autorização não é extensiva a outros casos
Em seu voto contrário à autorização da interrupção da gravidez de feto anencéfalo, o ministro Ricardo Lewandowski levantou a possibilidade de que a prática pudesse ser estendida à gestação de bebês com outras anomalias. “É fácil concluir que uma decisão judicial isentando de sanção o aborto de fetos portadores de anencefalia (...), diante dos distintos aspectos que essa patologia pode apresentar na vida real, abriria as portas para a interrupção da gestação de inúmeros outros embriões que sofrem ou venham a sofrer outras doenças, genéticas ou adquiridas, as quais, de algum modo, levem ao encurtamento de sua vida intra ou extrauterina”, afirmou o ministro em seu voto.
Contudo, juristas ouvidos pela Gazeta do Povo dis­­seram acreditar que essa interpretação não será possível. Segundo eles, o Supremo autorizou a prática de interrupção da gravidez em um caso específico – em que não haveria vida – e que, portanto, não seria considerado crime. “Não estão autorizando qualquer tipo de aborto, muito menos o aborto eugênico. Não é isso. O que se pretende é antecipar o fim da gravidez como um direito de escolha da gestante”, explica a mestre em Direito Constitucional e professora da Universidade Positivo Bettina Augusta Amorim Bulzico.
O professor de Direito Constitucional da Uni­­ver­sidade Federal do Paraná Egon Bockmann Moreira afirma que a escolha pelo procedimento médico só pode ser feita no caso específico que foi objeto do pedido e da decisão do Supremo. “Não existe a possibilidade de se fazer uma interpretação extensiva e analógica da decisão. Ela não se presta a isso”, diz.
A hipótese de se ampliar esse precedente também não seria viável, porque somente na excepcionalidade de não haver vida é que se justifica a antecipação do parto. “A deficiência pode haver, mas, se a vida for viável, independentemente das condições de saúde da criança, não é possível antecipar o parto”, diz o advogado e professor de Direito Penal René Ariel Dotti.
Direito x moral
Ainda, para o professor de Filosofia do Direito da PUCPR, Antonio Celso Mendes, é necessário separar a perspectiva moral da jurídica. “Na jurídica, a concessão dessa descriminalização é um ato importante, porque a criança sem o cérebro vai morrer. Na [perspectiva] moral, fica a cargo de cada mãe, de cada família, resolver o que fazer”, diz.
O professor Moreira ressalta que não se instalou um dever para as grávidas, mas a opção, o direito de escolha. “Se essa escolha for feita, ela não pode mais ser tipificada como crime.”
Kamila Mendes Martins
O Código Penal, em vigor desde 1940, prevê apenas dois casos para autorização de aborto legal: quando coloca em risco a saúde da mãe e em caso de gravidez resultante de estupro. Qualquer mudança dessa lei precisa ser aprovada pelo Congresso. Por 8 votos a 2, o STF julgou que o feto anencefálico não tem vida e, portanto, não é possível acusar a mulher do crime de aborto. “Aborto é crime contra a vida. Tutela-se a vida em potencial. No caso do anencéfalo, não existe vida possível”, afirmou o relator do processo, ministro Marco Aurélio Mello.
Saúde da mãe
Além desse argumento, a maioria dos ministros reconheceu que a saúde física e psíquica da grávida de feto anencéfalo pode ser prejudicada se a gestação for levada até o fim. Conforme médicos ouvidos na audiência pública realizada pelo STF em 2008, a gravidez de feto sem cérebro pode provocar uma série de complicações à saúde da mãe, como pressão arterial alta, risco de perda do útero e, em casos extremos, a morte da mulher. Por isso, ministros afirmaram que impedir a mulher de interromper a gravidez nesses casos seria comparável a uma tortura.
Obrigar a manutenção da gestação, disse Ayres Britto, seria impor a outra pessoa que se assuma como mártir. “O martírio é voluntário”, afirmou. “Dar à luz é dar a vida e não a morte”, afirmou.
O ministro Gilmar Men­des, que também foi favorável à possibilidade de interrupção da gravidez, sugeriu que o Ministério da Saúde edite normas que regulem os procedimentos que deverão ser adotados pelos médicos para garantir a segurança do tratamento. Apenas dois ministros votaram contra a liberação do aborto – Ricardo Lewandowski e o presidente do STF, Cezar Peluso. Lewandowski julgou que somente o Congresso poderia incluir no Código Penal uma terceira exceção ao crime de aborto. Peluso disse que “o aborto provocado de feto anencéfalo é conduta vedada de modo frontal pela ordem jurídica.”
Religiosos
Gilmar Mendes reclamou da decisão do ministro Marco Aurélio de negar a participação de setores religiosos no julgamento, fazendo sustentações orais no plenário do STF. “As entidades religiosas são quase que colocadas no banco de réus, como se estivessem a fazer algo de indevido. E é bom que se diga que elas não estão fazendo algo de indevido ao fazer as advertências”, disse.

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